Santa Catarina

(Assomada, 24 de Dezembro de 2007)

No dia 24 de Dezembro, estava ainda indecisa quanto ao local onde ia passar a noite de natal. A minha prima Janine apresentou uma lista de argumentos a favor de uma noite de natal em Assomada. A Chuna acrescentou mais argumentos, realçando que quase toda a malta do Liceu estava em Assomada: Gi, Ed, Gaby, Gerson, Filó, Elsio, Ângelo, Pija, Wilson, Jiverson, Belo e Ivandro. Claro, também: a Chuna, a Janine e eu. Então, tomei a minha decisão, pensando em Assomada Nocturna de N’Ze di Sant’y ÁGu. E, pouco depois, a Chuna disse-me: “o Marco já voltou”. E eu: “o Marco está aonde?”... Fomos ao encontro do Marco Paulo Varela. E lá estavam mais outros colegas do Liceu, incluindo o Ivandro Pires, no futebol de sempre. Antes de relatar o meu reencontro com o Marco e o Ivandro, vou voltar para o nosso primeiro encontro.

Numa manhã qualquer de Outono, quando caminhava para o antigo Liceu de Santa Catarina (actualmente, designado por Liceu Amílcar Cabral), vi aquele rapaz delgado seguir ao lado de um outro rapaz mais baixinho. Eram o Marco e o Ivandro. Passando meses, recebi uma convocatória do Já Pixoka para a participação numa reunião, no salão do Liceu. Fui para a tal reunião. Quando lá cheguei, encontrei o Marco e o Ivandro. Estavam a falar na criação da Comissão de Finalistas 2000. Da minha turma (11º ano, Es3), o Já Pixoka e a Eneida estavam por dentro do assunto. No final da reunião, mais oito pessoas da turma aceitaram fazer parte da Comissão (Janine, Geórgeth, Chuna, Belo, Carla, Wilson, Elsa e eu). O Já Pixoka e a Eneida não continuaram até ao fim, porque enfrentaram outros desafios e obstáculos. Havia também colegas de Es1 (Ângelo, Quim e Chido), de H2 (Marco) e de Ct3 (Ivandro, Gy, Jiverson e Zema). No final da caminhada, éramos cerca de 15 membros: Marcos, Ivandro, Janine, Jiverson, Geórgeth, Zema, Chuna, Belo, Carla, Wilson, Quim, Ângelo, Elsa, Chido e eu. Na Comissão, não havia hierarquia. Cada membro tinha a sua função.

Durante dois anos, procuramos dar vida ao Liceu e angariar capital financeiro suficiente para fazer a Grande Festa de Finalistas 2000, com a realização de: actividades culturais, no Museu da Tabanca; Concursos Cultura Geral, no Liceu; matiné dançante, no Tropical. Tínhamos os bolos da Janine, o Dj Wilson, o tesoureiro Jiverson, a modelo Geórgeth, a amizade da Eneida sobrinha do Amândio (sócio nº1 do Tropical), etc. E ainda tínhamos uma espécie de sede: o ZEIJM. O ZEIJM era o ponto de encontro de cinco amigos: Z – Zema; E – Edson; I – Ivandro; J – Jiverson; M - Marco. Como quatro dos sócios do ZEIJM faziam parte da Comissão, não foi difícil transformá-lo na nossa sede.

O ZEIJM era uma casa muito escura, onde podíamos reunir. Lembro-me que, a casa pertencia a um imigrante irmão do Zema, havia Whisky numa estante também escura e os miúdos da Comissão gostavam de sentar no sofá do meio da sala com copos à frente. Como tudo era escuro (nem havia luz eléctrica, apenas um motor raramente usado), o ZEIJM era um bom espaço para namoricos. É pena que não havia casais na Comissão. Apenas grupinhos de amigos: Jiverson e Zema; Carla e Elsa; Belo e Wilson; Janine, Geórgeth e Chuna; Quim, Ângelo e Chido; Marcos, Ivandro e eu. Foram dois anos de intensa amizade e múltiplas cumplicidades.

Hoje, ao desfolhar o meu diário cor-de-rosa, relembrei-me de coisas incríveis que escrevi sobre o Marco e o Ivandro: “Marco, meu melhor amigo. Aquele que mudou o ritmo dos meus dias […]. Ivandro, meu tio (prefiro dizer: meu primo) e meu grande amigo. Amigo de todos os momentos”. Também apalpei as letras do Marco e do Ivandro, gravadas no meu diário. E esses versos com a cara dos tempos do Liceu (!): “(…) Na tua parte negativa / há algo que me cativa!” (Marco); “a mais doce de todas as doçuras da vida é a amizade” (Ivandro) (27/12/1999). Lembro-me desse dia. Estávamos a preparar a festa da passagem para o ano 2000, organizada pela Comissão de Finalista 2000 e pelo Grupo Black Street. Havia boatos de que o mundo estava prestes a desmoronar-se. Num passo de magia ou de tormento, tudo ia terminar. Então, pela via das dúvidas, decidimos reunir a malta amiga para passarmos juntos a chegada ou não do desejado/temível ano 2000. Na altura, uma boa parte das miúdas da Comissão era virgem. Daí aquele suspense (!): “será que Deus é tão mau para nos deixar morrer virgens?!”

Lembro-me como se fosse ontem de quando regressei para Calheta, levando todas as minhas malas e caixas de livros. Ou seja, toda a minha tralha de estudante. Foi no dia 22 de Julho de 2000, tinha terminado a época das Provas de Acesso ao Ensino Superior. Ainda tenho registado a dor que senti ao deixar Assomada, após dois anos de estudo, amizade e namoricos. A minha dor era maior quando pensava no Marco e no Ivandro: já não podíamos passar horas e horas a jogar conversa fora, a planear fugas colectivas para o interior da ilha, a sonhar com o futuro que nos era distante, etc. Meses depois, no dia 10 de Novembro, fui despedir-me d@s amig@s, porque ia seguir para Coimbra. E, pela primeira vez, vi três pernas de lágrimas deslizarem pela cara do Marco e um sorriso triste na cara do Ivandro. Um ano depois, o Marco foi para São Paulo, frequentar o curso de Ciências Sociais. O Ivandro ficou no país, matriculado numa instituição de Ensino Superior. Anos mais tarde, reunimos no Hi5. Sete anos depois, conseguimos estar juntos no mesmo espaço real. Assim, ganhei o Natal...

 
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