A DOR DAS RAÍZES


Sem querer
Cantas as tuas raízes
Escondidas entre as rochas

Maltratado pela angústia
Soluças o teu desconforto
Seco de tanto esperar

Protegido pelo muro da academia
Rodopias entre as luzes
Embutidas sobre prismas de escuridão

Mesmo xingando, gritando e fugindo
Para o teu próprio desespero
Palpitas esperança nas montanhas e nos vales

Eurídice

AFROBASKET

“Bravos crioulos”, “novos heróis”, “grandes guerreiros”... Várias expressões têm sido (re)inventadas para classificar a atitude dos jovens cabo-verdianos no Campeonato Africano de Basquetebol, que decorreu em Angola (entre 15 e 25 de Agosto).

Os nossos basquetebolistas deram um “show de bola” nesse campeonato, tendo conquistados o terceiro lugar. A aventura d’bronze tem sido aclamada no território nacional e na diáspora cabo-verdiana, sendo esta “o Pico de Antónia” na vida da selecção nacional no âmbito do Afrobasket.

Para além dessa honrosa classificação, dois atletas cabo-verdianos (Houtman e Rodrigo) foram incluídos na lista dos cinco melhores basquetebolistas africanos. Houtman foi ainda eleito o melhor lançador do Afrobasket2007. Para juntar ao Rodrigo, mais dois atletas cabo-verdianos (Houtman e Marito) foram escolhidos para trabalharem ao serviço de equipas angolanas.

Não podia ignorar a exibição da selecção angolana, que conquistou o nono título continental. Mas os meus olhares estão direccionados para o basquetebol cabo-verdiano, que avança a passos largos. Hoje, com a chegada da selecção ao país, haverá uma festança daquelas nunca dantes imaginadas.

Mesmo não tendo tido a disponibilidade para acompanhar os jogos, fui recebendo informações através de amigos/as e seguindo através de blogues e jornais online.

Aproveito também para deixar aqui os meus miminhos, abraços e beijinhos aos basquetebolistas cabo-verdianos, que deram o máximo para brotar mais um sorriso colectivo com assinatura da cordialidade cabo-verdiana.

BOKA-PORTU


Aprendi a nadar na baia do Porto. Quando era pequena, fingia que era sereia. Gostava de subir à pedra-preta, mostrando apenas a minha metade humana. Desejava ter cauda para mergulhar no fundo do mar. O mar fazia parte das minhas fantasias!

Enquanto brincava de sereia, o meu mano Lindo (Monga para os amigos da bola) tentava aprender a pescar. Em Bosta Minhoto, ele quase descobriu o segredo dos pescadores: uma vez, capturou um “manelon”; outra vez, conseguiu enforcar um polvo.

O ponto auge da sua distinta carreira de menino-pescador, foi no dia em que esmagou uma moreia. Os anos passaram e a baia do Porto foi se tornando pequena demais para tantos sonhos. Fugi para terras distantes, procurando uma universidade de que costumava ouvir nas conversas do meu avô. E o meu mano desistiu da arte de pescar, procurando o futuro entre a Sociologia e o Direito.
...............
(Todas essas lembranças vieram-me à mente depois de esbarrar no Hi5 do meu mano, que me brindou com uma linda fotografia da baia do Porto. Mau fotógrafo! Se esse fotógrafo tivesse virado pelo menos 2cm à direita, eu contemplaria a casa caiada de branco, onde cresci.)

“AS NOVAS CRUZADAS”

Ontem, a Néle Azevedo regressou da XIV Bienal Internacional de Arte de Vila Nova de Cerveira, tendo como tema “As novas cruzadas”, pensado no sentido de desafiar os artistas a fazerem uma analogia entre as antigas cruzadas e as novíssimas guerras. Este bienal começou no dia 18 de Agosto, sendo previsto decorrer até o dia 29 de Setembro do corrente ano.

Impressionante, quase tudo me leva à São Miguel! Como sabem, 29 de Setembro é o dia de São Miguel Arcanjo, o padroeiro do meu concelho. Uma vez que São Miguel tem sido apresentado como o príncipe das milícias celeste, a data para o terminus da bienal parece que foi mesmo bem planeada.

A brasileira Néle Azevedo ficou conhecida pelo seu Projecto Monumento Mínimo, que já percorreu várias cidades e países. Esta artista adopta cada cidade como um cenário para a sua arrojada exposição, mostrando ao público diversificado as suas estatuetas de gelo. São figuras anónimas que se diluem na multidão em trânsito.

A(S) LÍNGUA(S)

Depois do jantar, o Julião começou com a treta sobre a língua portuguesa. O sotaque da Andreia e da Néle não disfarçavam a diferença “portuguística” no espaço da CPLP. O João conteve-se e não entrou na discussão, mas tinha o Julião como o seu legítimo representante da Guiné-Bissau. Mas eu não podia ficar calada!...

Lembrei-me logo do post no albatrozberdiano sobre a problemática da língua cabo-verdiana, melhor sobre o bilinguismo no meu país. Realmente, o debate sobre a(s) língua(s) merece ser aflorado e levado a sério pelos responsáveis directos no processo de afirmação da língua cabo-verdiana.

Nesta minha nota curta, quero realçar apenas duas questões que tentei introduzir na discussão com os/as meus/minhas amigos/as do Brasil e da Guiné-Bissau. Em primeiro lugar, a questão da geopolítica da língua. Pensando no quadro da “dita” CPLP, a questão do alfabeto unificado deixa-me com uma “pulga” atrás da orelha. Parece-me que torna-se necessário ter em atenção os jogos de poder(es) nesse espaço em que o português nos (des)une.

Em segundo lugar, o fenómeno da globalização. Comungo da ideia do Boaventura de Sousa Santos de que vivemos num mundo de globalização, como num mundo de localização. Por conseguinte, subscrevo integralmente a ideia do mesmo autor de que o global e o local são socialmente produzidos no interior dos processos de globalização e aquilo a que chamamos globalização é sempre a globalização bem sucedida de um determinado localismo. Portanto, se a globalização pressupõe a localização, então ao mesmo tempo que o uso do inglês se intensifica à escala global, faz todo sentido a afirmação da língua cabo-verdiana. Aceitar que é inútil o investimento na língua cabo-verdiana significa “sacrificar a diferença em nome de um princípio de assimilação”.

O teórico literário Walter Mignolo realça que, uma vez que as línguas não são algo que os seres humanos têm, mas algo que os seres humanos são, a colonialidade do poder e do saber veio gerar a colonialidade do ser. Com essa referência, quero frisar o direito e o dever que temos (refiro-me aos/às cabo-verdianos/as) de valorizar a língua cabo-verdiana, não só enquanto elemento cultural, mas também como veículo de produção de conhecimentos/saberes, mesmo que sejam (ou sobretudo porque são) os conhecimentos/saberes “catalogados” como tradicionais...

NEM AS LÁGRIMAS RESISTEM

Quando acordei, o sol do meio-dia já se fazia sentir. Sem sair do meu quarto, sintonizei a RDP-África e abri o meu computer. Para a minha alegria ou tristeza, um email de Rui Machado tinha invadido o meu esconderijo-ciber, trazendo uma encomenda enfeitiçada. Deliciei-me até a última gota da melodia. Não podia resistir às mornas, algo que nem as lágrimas resistem!

Pensando na diáspora da música cabo-verdiana, o projecto “Lisboa nos Cantares Cabo-verdianos”, coordenado por Rui Machado, aclama Lisboa como a capital da saudade, ou a capital da (décima) primeira ilha de Cabo Verde. Numa pesquisa instantânea sobre esse projecto, tropecei-me no mar...

De tantas saudades da baia de Achada Portinho, da praia da Batalha, de Bosta Minhoto e de Baxu-Ponta, não resiste-me a mergulhar com o B.Leza num Bejo de Sodade (“Onda sagrada di Tejo / Dixa’m bêjabo bô aga / Dixa’m dabu um bêjo / Um bêjo di mágua / Um bêjo di sodade / Pá bô lêvá mar / Pá mar lêvá nha terra” [...]).

AS DUAS CAMAS

Eram quase 17:30mn, fui andando pela calçada até a Avenida Dias da Silva. Virando à esquerda, encostadinha na minha segunda casa (a minha faculdade de sempre), fui caminhado no silêncio da cidade. Em vez de seguir para a rua Luís de Camões, esquivei pela esquerda e, ainda sempre à esquerda, avistei a Casa-Museu Miguel Torga, que estava escondido no fundo da Praceta Fernando Pessoa (nº 3).

Entrei pela meia-porta e segui em frente até ao jardim. Fiz uma volta 180º e, pela porta lateral, vi uma distinta senhora de cabelos cor d’oiro. Entrei com a minha atenção redobrada e, desde o hall de entrada, fui sendo confrontada com objectos pessoais de Miguel Torga. Esta casa onde vivia o escritor, recheada com objectos rústicos (artisticamente lapidados) como se fossem feitos de pau-brasil, guarda o espírito da escrita. Até parece que fertilizou a minha imaginação!

Foram instantes de muita admiração pelos objectos pessoais e pelo acervo documental do escritor (bibliografia activa, bibliografia passiva, artigos de imprensa, poemas manuscritos e dactiloescritos).A surpresa maior (estranha mesmo!) foi quando entrei no quarto de casal, quer dizer no quarto onde o escritor dormia com a sua esposa. Para meu espanto haviam duas camas individuais, separadas por uma mesa-de-cabeceira. A distinta senhora de cabelos cor d’oiro disse-me sorrindo que ter duas camas individuas em quartos de casais podia ser normal na “época”... Fiquei a pensar, com tamanha estranheza: 1) Mas em pleno século XX num Portugal contemporâneo? 2) E o terrível frio de Coimbra quando se inverna? 2) Talvez, o escritor não gostava de cotoveladas!...

“PASÁRGADA”

(quarta-feira, 15 de Agosto, 13h...)

A Andreia chegou ontem, lacrimejando as saudades de “A Terra de Vera Cruz” e partilhando a sua ainda curta vivência em Coimbra.

Passamos a noite toda a jogar conversa fora no msn com a Ana e o José, paulistas convictos. Quase nos apetecia aceitar o convite de Manuel Bandeira (Vou me embora pra Pasárgada) ou lamentar as saudades como o Osvaldo Alcântara (Itenerário de Pasárgada)... Com toda a minha rebeldia, preferi abraçar o Ovídio Martins (Antievasão) e afirmar categoricamente “não vou para Pasárgada [!]”.

“FEITIÇO”

...Chuva em Agosto. Acordei por volta das 10:30mn, a Andreia ainda está dormida e a chuva continua a cair para ninar a cidade que corteja mais um feriado religioso.

Neste momento, estou a ouvir o André Sardet cantar Feitiço, desejando também “não ter asas e poder voar / ter o céu como fundo / ir ao fim do mundo e voltar”. Mas no fundo, ”eu gostava que olhasses para mim / e sentisses que sou o teu mar / mergulhasses sem medo / um olhar, um segredo / só para eu te abraçar”...

15 DE AGOSTO

Acho que o título diz tudo... Não vale a pena dizer mais nada! Vou dormir. Já são 2:40mn. Estou com sono! Mas não estaria com tanto sonho, se estivesse lá... Lá na minha vila. Calheta, Calheta!

Desde o dia 8 de Agosto, que estou na contagem decrescente, imaginando a festa de Nossa Senhora do Socorro.

Neste momento, estaria no grande baile. Amanhã acordaria tarde, sem vontade de lambuzar na doçaria, arrependendo no dia seguinte. Vou dormir mesmo! Chega de imaginações férteis...

EILEEN NO PANORAMA BAR

Stop!!!... Notícia de última hora: o lançamento de Eileenístico: Contos e Crónicas passa a ser no Panorama Bar, em pleno Hotel Praia Mar. Já estou mesmo a ver! Hummm…

Para além da música, haverá poesia e beleza, características da morabeza cabo-verdiana.

“EILEENÍSTICO”

No dia 2 d’Agosto, o Centro Cultural do Mindelo recebeu a jovem cabo-verdiana Eileen Almeida Barbosa para a apresentação do seu livro Eileenístico: Contos e Crónicas.

Por sua vez, hoje o Tabanka Mar enche-se de música para acolher o lançamento desse livro na cidade da Praia.

Ainda não vi o livro, mas suponho que o sorriso alegre da Eileen tenha invadido a sua própria escrita, flutuando ao som das ondas acalentadas…

MIGUEL TORGA

Amanhã, o Município de Coimbra celebra o Centenário do Nascimento de Miguel Torga. Este escritor nasceu a 12/08/1907, em Vila Real; viveu em Coimbra e aqui morreu a 17/01/1995.

Miguel Torga foi considerado uma das mais marcantes figuras da literatura portuguesa do século XX. A sua produção literária abarca géneros como a poesia, o romance, o conto, o ensaio, as conferências, o memorialismo e a diarística.

O escritor esteve ligado à Revista Presença, tendo fundado a Revista Sinal e a Revista Manifesto. Foi proposto, por três vezes (1960, 1978 e 1994) para a atribuição do Nobel da Literatura. Entre vários prémios atribuídos ao escritor, destaca-se o Prémio Camões (1990).

Quanto às actividades programadas para a comemoração do centenário de Miguel Torga, importa realçar principalmente a Inauguração do Monumento a Miguel Torga (Largo da Portagem) e a Inauguração da Casa-Museu Miguel Torga...

MADDIE

(sábado, 11 de Agosto, 20h10...)

100 dias depois do desaparecimento da menina inglesa!... Depois desses dias de esperança, a Polícia Judiciária admitiu publicamente, numa entrevista à BBC, que a pequena princesa Madeleine McCann pode estar morta. Essa constatação, com base em pistas que foram recentemente encontradas no decorrer das investigações, não descarta as outras pistas de investigação.

Um pouco por todo o mundo, tem vindo a ser lembrando tantas outras crianças desaparecidas. A mediatização do caso Maddie tem contribuído bastante para quebrar o silêncio... Ninguém devia consentir com tamanha crueldade (!), que tem vindo a ser um drama frequente nos últimos anos.

Com o apoio dos pais da Maddie (Gerry e Kate), o YouTube vai disponibilizar um canal sobre crianças desaparecidas, tendo como nome “Don’t You Forget About Me” (Não te Esqueças de Mim). Neste novo canal do YouTube, serão colocados fotografias e vídeos de crianças desaparecidas. Também as pessoas serão encorajadas a darem informações às autoridades...

AGOSTO EM COIMBRA

No meu percurso diário, descendo e subindo pela calçada, mal escuto o vento assobiar.

Durante o dia, a cidade de Coimbra parece mergulhada numa eterna tranquilidade. Os sinais de trânsito deixaram de ter tanta utilidade.

Com o cair da noite, esta cidade adormece num silêncio sem fim, denunciando sobretudo a solidão dos bares e dos cafés. Não sei se há fado no Diligência, nem se há jantar no Casarão!...

Soube que, desde 1 d’Agosto, na minha vila piscatória, tem havido música boa na praça do Porto (rádio praça). Que saudade! A rouquidão da minha voz denunciava sempre uma noite ao relento, bebendo incansavelmente da brisa do mar... “Ah! Kaoberdi! Largau dja so si... ...” (usando a força poética de Káká Barboza).

O CIBER, A IDENTIDADE E A ÉTICA

O espaço ciber tem vindo a ser utilizado para fins diversos, sendo considerado um dos espaços mais democráticos do nosso tempo.

Apesar da desigualdade mundial no acesso ao espaço ciber, tem vindo a crescer de forma aceleradíssima o número de navegares no espaço virtual nos diferentes cantos do mundo. O ciber está na moda!...

A Internet pode ser um espaço de divulgação das nossas ideias e dos nossos valores, sendo fundamental para a difusão dos ideias por que tod@s lutamos (justiça social, democracia, cultura da paz, multiculturalismo, cidadania, equidade, reconhecimento, redistribuição, dignidade humana, etc.).

Entretanto, sabemos que circulam no espaço ciber um conjunto de outros gestos e acções que comprometem seriamente a ética, a democracia e o exercício da cidadania. Para ser clara, muitas pessoas usam a Internet para fins pouco éticos!... Daí que, uma das questões que deixo aqui para um possível debate é a relação entre o ciber, a identidade e a ética.

A MORTE DO ESCRITOR

Como informa o jornal asemana online (www.asemana.cv), morreu o professor, cientista e neurocirurgião João Manuel Varela, que também foi um dos mais reputados escritores cabo-verdianos.

João Manuel Varela padecia de uma doença grave há mais de três anos, sendo que nos últimos meses encontrava-se praticamente em estado vegetativo. Morreu aos 70 anos de idade, na sua cidade natal (Mindelo, ilha de São Vicente).

O escritor usava como pseudónimos: João Vário e Timóteo Tio Tiofe (poesia); G. T. Didial (ficção e ensaios).

A sua obra, em especial a poética, tem sido considerada pela crítica como uma das mais complexas e ricas produzidas por um criador cabo-verdiano. “O primeiro livro de Notcha”, “O segundo livro de Notcha”, “O estado impenitente da fragilidade” e “Contos da Macaronésia” são apenas algumas referências da produção literária do autor...

"A MENIMA MORTA"

Ontem, li no asemana online (www.asemana.cv) uma nota sobre a morte de uma jovem, filha de imigrantes cabo-verdianos na Holanda. A jovem estava de férias, em Cabo Verde, e foi surpreendida por um trágico acidente de viação.

Fiquei abalada com a notícia, que soube primeiramente através de um amigo parente de “a menina morta” (usando a formulação literária do brasileiro Cornélio Penna).

Nesses momentos de confronto com a morte, aproveitamos quase sempre para questionar a nossa existência. Embora sabemos que, neste lado da linha abissal, a vida é instantânea, ninguém pensa na transição aos 18 anos...

8 DE AGOSTO EM PILÃO CÃO

8 de Agosto! Acabei de receber uma mensagem do meu amigo Arlindo sobre a festa em Pilão Cão.

Quase no mesmo instante, o caloirinho Tino disse-me que está muito atrasado para a referida festa, mas marcará a sua presença este ano no seu querido planalto.

Em Ponta Tadju, imagino o Anastácio com a cara esticada em direcção ao Pico de Antónia ou de queixo caído vislumbrando a ribeira de São Miguel... Suponho que o campo já se cobriu de verde.

“CABO VERDE E A CEDAW”

No dia das mulheres africanas (31 de Julho), o Instituto Cabo-verdiano para Igualdade e Equidade de Género (ICIEG) fez o lançamento do livro Cabo Verde e a CEDAW: Relatório à Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra as Mulheres e Documentos Conexos.

A CEDAW foi adoptada pela ONU, em Dezembro de 1979. E, em Dezembro de 1980, foi ratificada por Cabo Verde.

VIOLÊNCIAS CONTRA AS MULHERES

No dia 31 de Julho, Cláudia Rodrigues publicou um artigo de opinião no jornal asemana online (www.asemana.cv), denunciando a violência doméstica, nomeadamente em Cabo Verde. Na qualidade de presidente do Instituto Cabo-verdiano para Igualdade e Equidade de Género (ICIEG), a autora do artigo (intitulado “A violência masculina como a configuração do mal em cabo Verde”) evidencia um conjunto de pressupostos em que se assentam as relações sociais de sexo no nosso espaço insular.

Neste meu diálogo harmonioso e solidário com a Cláudia Rodrigues, retomo duas ideias avançada no referido artigo:
1) “Na sociedade cabo-verdiana, a naturalização e a persistência da violência física e simbólica sobre as mulheres têm carácter estrutural e atravessam todos os segmentos”;
2) “A nossa sociedade tem dado pouco mais do que uma importância retórica as questões de género e, em última instância, acaba por ignorar e ficar indiferente ao drama social da violência contra as mulheres”.

Realmente desde a independência nacional, esforços significativos têm sido dispendidos no sentido da melhoria da situação das mulheres cabo-verdianas. Entretanto, apesar dos compromissos regionais e internacionais assumidos pelo Estado de Cabo Verde no sentido da promoção da igualdade entre os homens e as mulheres e do quadro legal preconizar a igualdade de direitos entre os sexos, proibindo quaisquer discriminações em função deste critério, persiste ainda uma grande discrepância entre as práticas legais e as práticas reais no nosso país (em prejuízo das mulheres). Ou seja, na prática ainda temos um caminho mais longo para percorrer.

Para além da violência doméstica denunciada pela Cláudia Rodrigues, saliento ainda: a submissão das mulheres sobretudo de estratos sociais mais vulneráveis; a discriminação no (acesso ao) mercado de trabalho em prejuízo das mulheres; a feminização do analfabetismo; a feminização do desemprego; a feminização da pobreza (sendo mais acentuada nas mulheres mães solteiras); a prostituição desmedida e desregulamentada; os abortos clandestinos, que marcam física e psicologicamente muitas mulheres cabo-verdianas; as duplas jornadas de trabalho (sendo que os trabalhos domésticos são relegados sistematicamente e quase exclusivamente às mulheres), etc.

No espaço doméstico no nosso país, a desigualdade de estatuto entre os sexos e a existência de um grande número de famílias monoparentais chefiadas por mulheres em condições laborais precárias e com baixo nível de instrução continuam a condicionar a situação das mulheres cabo-verdianas, particularmente no que se refere ao exercício dos seus direitos cívicos e políticos. O peso das tradições culturais (tendo sido evidente a secundarização do papel das mulheres ao longo do processo histórico de desenvolvimento de Cabo Verde) continua a condicionar as mulheres cabo-verdianas a uma situação de subalternização em relação aos homens e, mais do que isso, a uma conformidade com tal situação.

Apesar dos avanços registados no nível de instrução das mulheres (sobretudo as das camadas mais jovens), a elevada taxa de mulheres analfabetas em relação aos homens e os preconceitos de várias ordens que ainda persistem, continuam a condicionar a emancipação das mulheres cabo-verdianas, perpetuando assim a sua subalternidade. No entanto, a incompreensão da utilidade/indispensabilidade do equilíbrio e da complementaridade entre os sexos em diferentes áreas tem vindo a ser atenuada, progressivamente.

A condição das mulheres perante o trabalho continua precária, sendo de realçar a forte dependência económica de muitas mulheres em relação aos seus maridos/companheiros. Entretanto, têm-se vindo a registar melhorias significativas. Grupos de mulheres profissionais – juristas, economistas, empresárias, etc. – têm vindo a reivindicar os seus direitos no plano laboral e a fomentarem debates sobre os direitos das mulheres e, em particular, sobre a condição das mulheres perante o trabalho.

Desta forma, temos que dar mais do que uma importância retórica as questões de género e não ficar indiferente perante as várias violências contra as mulheres. Efectivamente, o desenvolvimento do nosso país depende da participação dos homens e das mulheres.

DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES

A luta pelos direitos humanos das mulheres tem vindo a ganhar terreno no contexto cabo-verdiano. Esta luta pode ser enquadrada numa perspectiva mais ampla que é o da luta pela dignidade humana.

No caso cabo-verdiano, desde a independência nacional, têm surgido nomeadamente várias instituições/associações cabo-verdianas de mulheres ou que trabalham – directa ou indirectamente – em prol da igualdade entre os sexos, sendo de destacar: a Organização das Mulheres de Cabo Verde (OMCV); a Associação de Apoio à Auto-Promoção da Mulher no Desenvolvimento (MORABI); a Rede de Mulheres Parlamentares Cabo-Verdianas (RMPCV); o Instituto Cabo-verdiano para Igualdade e Equidade de Género (ICIEG); a Comissão Nacional de Direitos Humanos e Cidadania (CNDHC).

A OMCV (criada em Março de 1981) tem desenvolvido actividades económicas, políticas, culturais e sociais, tendo vindo a promover nomeadamente: acções educativas e formativas; alfabetização de adultos; jardins infantis comunitários; centros de promoção feminina; actividades geradoras de rendimentos; cooperativas de mulheres; programas de micro-crédito.

A MORABI (criada em Março de 1992) tem trabalhado no sentido de aumentar a capacidade de intervenção das mulheres na sociedade cabo-verdiana e a sua participação no processo de desenvolvimento económico, político, cultural e social de Cabo Verde, como também no sentido de propiciar a igualdade de oportunidades entre os homens e as mulheres nesse país. Esta ONG tem privilegiado as seguintes áreas de intervenção: micro-crédito; formação; desenvolvimento comunitário; Saúde Sexual e Reprodutiva.

A RMPCV (criada em Outubro de 2002), integrada no espaço político, tem trabalhado sobretudo no sentido de defender a igualdade de direitos entre os homens e as mulheres. A luta em prol de uma maior participação das mulheres cabo-verdianas nos órgãos de poder político parece estar no centro da sua atenção.

O ICIEG, enquanto instituição pública responsável pela promoção da igualdade de direitos entre os homens e as mulheres e pela integração efectiva das mulheres nas diferentes áreas, tem elaborado planos de acção nacional para a igualdade, que têm sido instrumentos fundamentais para o desejado/desejável desenvolvimento equilibrado de Cabo Verde.

A CNDHC tem trabalhado – tendo em atenção as recomendações saídas da Conferência de Viena sobre os Direitos Humanos (em 1993) – no sentido de proteger e promover os direitos humanos e favorecer a educação para a cidadania, em Cabo Verde. Esta instituição pública tem desempenhado as suas actividades com base no Plano Nacional de Acção para os Direitos Humanos e a Cidadania em Cabo Verde (PNADHC), que tem como um dos seus objectivos a protecção e promoção dos direitos humanos e da cidadania dos grupos sociais mais vulneráveis (como as mulheres).

 
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