Dia das Mulheres Africanas

MULHER, Mulheres

Não sei o que escrever neste dia dedicado às mulheres do meu chão! Talvez deveria escrever uma carta para contá-las um segredo, daqueles que só as mulheres conhecem... Se tivesse uma pena suave, talvez escreveria um poema, daqueles que acordam a alma feminina escondida atrás da cara fumada, do peito caído, da saia molhada, da pele queimada, da mão enodoada... Se fosse bailarina, talvez arriscaria a pista quão uma estrela para iluminá-las de riso... Se fosse encantada cantadeira, talvez entoaria uma linda canção, daquelas de arrepiar o leão... Porém, como me falta jeito para essas coisas, vou saltar para o próximo ponto.


Blog pela Educação

Para não deixar apagar a luz que acendemos no mês de Junho, hoje, dia das mulheres africanas, enquanto a classe política cabo-verdiana sentada na Assembleia Nacional faz a seu jeito uma avaliação do Estado da Nação, aproveitamos para lança um Blog pela Educação, onde se pretende juntar e divulgar um conjunto de informações contra a medida de exclusão das alunas grávidas dos estabelecimentos de ensino secundário em Cabo Verde: legislação; estatísticas nacionais e internacionais; posicionamentos de instituições e de personalidades; declarações políticas; material de imprensa; textos de opinião; reacção na blogosfera, etc. Num apelo ao “Djunta-mon pela Educação”, esse movimento espontâneo solicita a sua colaboração e conta consigo nesta causa, que é uma causa das mulheres e dos homens que lutam por uma sociedade mais justa, democrática e de respeito para com os direitos humanos.

1 ANO… nem senti o deslizar do tempo

Acordei com o sabor das palavras nos meus lábios, o desejo de soltar um grito pela sensação do primeiro aniversário deste ciberesconderijo, uma vontade de apalpar os rostos escondidos atrás de cada blog, um querer apertar as mãos anónimas que rabiscam num post ou noutro...

No dia 25 de Julho de 2007, comecei a nadar na blogosfera. Numa pranxa verdazul, fui tacteando no abecedário, dando cambalhota do meu jeito. Era para ter colocado este post ontem, mas não me recordava com precisão da data do aniversário. Só agora, numa visita cuidadosa ao blog, reparei-me que afinal já fez um ano, nem senti o deslizar do tempo... Nesta data de bolinhos e abraços, para além de oferecer flores às visitas, aproveito para falar um pouco de mim. Não sei como começar!... Sou uma cabo-verdiana quase perdida numa cidade distante: Coimbra. Passo os meus dias entre os livros e afastada dos miminhos da terra mãe. Sinto múltiplas saudades, vontade de chorar e outros sintomas parecidos...

Adoro a noite e, quando a escuridão invade o silêncio do pátio que cerca a vista do meu quarto, vagueio-me pela blogosfera. Decidi criar este ciberesconderijo de sociabilidade (que o Mito designou por “blogville”, para além de ter escolhido o bouquet de apresentação), para despejar as minhas angústias, emoções e pequenas reflexões comprometidas com o lema “Igualdade na Diferença”. Desde aquela quarta-feira, quando um menino de olhos azuis me desafiou a criar este espaço de partilha das coisas banais que me tocam a alma, fui deixando a madrugada penetrar no meu ser, enquanto misturo a realidade e uma faísca de ficção, deixando flutuar um pedaço de mim, dos meus sonhos, dos meus afectos e dos meus desejos.

Confesso que, muitas vezes, quando deixo ou encontro palavras neste ciberesconderijo, perninhas de lágrimas melancólicas deslizam pela minha face de menina-mulher. Recordo-me de um dia em que recebi uma visita da Lilian, que falava nos meus olhos tristes. Não consegui aguentar, desabrochei-me em soluços. Maravilha mesmo são os momentos de boas risadas, de conversa afiada, de cumplicidades e de solidariedade blogosférica. Não consigo descrever a minha alegria quando recebo visitas de pessoas amigas ou de outras desconhecidas. Gosto de receber as visitas com amabilidade, imaginando este cantinho como uma casa arejada e com muita luz do sol, na minha aldeia, no interior de Santiago.

Entre vários rascunhos que deixei aqui, vou escolher quatro de que mais gostei e que me trouxeram lembranças alegres da minha baía: boka-portu (registos quase-esquecidos), boka-portu, A Ilha da Batalha e Orfeu e Eurídice. Entre os comentários, muitos me tocaram profundamente e também muitos me obrigaram a reflectir sobre o segredo das palavras, a magia dos gestos e o calor dos afectos. Vou deixar em baixo alguns que são uma delícia, um verdadeiro glace de baunilha e chocolate do Marisol, num final de tarde, na Prainha.

Através da blogosfera, tenho conhecido muitas pessoas bonitas e queridas. Ganhei um primo, Tide Pedra; descobri uma amiga de infância, Eileen; e, como o mundo é pequeno, encontrei o Paulino, o menino de sorriso verde, que, afinal, é meu vizinho lá na capital. A vontade de viajar pela blogosfera e os diálogos construídos no meu ciberesconderijo ou noutras bandas foram sempre um incentivo para continuar a partilhar as palavras da forma como gosto, sem preconceito e com ternura.

«As palavras têm para mim uma carga. Sinto-me incapaz de escapar à mordedura de uma palavra, à vertigem de um ponto de interrogação» e, «quando escrevo, procuro tocar afectivamente o meu leitor... isto é, irracionalmente, quase sensualmente.», transcrevendo as belíssimas palavras de Frantz Fanon, in Peau Noire, Masques Blancs.


……………

conversa afiada, pedaços de ternura


o acto de descobrir...

«Não sei como o teu blog surgiu no meu caminho. Ou terá sido o contrário? O certo é que, um dia, ao navegar nessa auto-estrada sem fim, cai neste mar de desabafos que passei a visitar amiúde. Não te conheço, Eury, mas toca o que escreves. Quem descreve assim as memórias da sua infância, das gentes da sua terra, tem pela frente sem dúvida muita história por viver (…)…»
«(...) Continuo a seguir com atenção o teu diário suave, este teu caderno de memórias feito poesia. Um testemunho a que nos vamos habituando... continua,»
Waldir

«Olha só como te descobri… Tu estás cá com uma garra! Isto vai desde a poesia, às teorias pós-coloniais, ou pós-colonizadas (dependendo do ponto de vista), das reivindicações de justiça e direitos, da luta, da doméstica e da domesticidade... Nem consegui ver tudo. E assim certinha e com disciplina. Mesmo bem, Eury. Curti bués. Agora tem-me calma e não me dês mais trabalho do que o que eu já tenho que o que eu não gosto mesmo é de trabalhar (caraças esta frase ficou com demasiados "ques"!). Tem mais: desculpa desiludir-te mas estou na fase de uma fatalidade tal que já prefiro 10000 azulejos para limpar do que um computador para escrever a frase de uma tese. Ok, eu posso escolher. No entanto, nestas alturas lembro-me sempre da Tabacaria de Pessoa: "Vivi, estudei, amei e até cri, E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu." porque antropafagiando o poeta : malhas que o império tece, jaz morta e apodrece a tese filha da mãe. E quanto ao comentário posterior sobre a maioria das mulheres que tem possibilidades de estudar e provavelmente nunca ocuparão cargos de chefia e sem querer ser ofensiva, só consigo pensar: - sorte a delas e do mundo que conta pensamentos informados e que nunca ocuparão cargos de medíocres e inertes. Um registo feminino testemunhal: eu não me chateio nada com essas questões sexuais porque o que eu quero da vida é não fazer nenhum. Olha lá, isto de escrever em blogs até é giro, que uma pessoa pode descarregar a neura e ninguém sabe. Manda lá com mais posts a ver se eu animo e continuo a estudar para "ser alguém na vida".»
Anónima subalterna


cantarolando,

«Já que o tema de conversa é fim-de-semana, e uma vez que ninguém se interessa pelo meu, aqui vai a minha reivindicação para que deixem os subalternos falar. Então foi mais ou menos assim: segui de carro até a casa de uns amigos, mas antes parei para meter gasolina (bués de cara, até dá vontade de dizer um palavrão!). Tinha levado uns panados de porco e um taxo de arroz de alho embrulhado no jornal (como eles tinham cervejas e gelado, tava-se bem). Sentei-me a seguir em frente a um computador velho na tentativa de instalar um sistema operativo mais recente. Afinal esse era o meu pretexto de escape. Falhei. Fui tomar café e depois vi têvê. O raio do computador antigo não me saía da cabeça de modo que nem sei qual era o filme que vi (mas deve ter sido daqueles americanos que acabam ao soco, porque para eu ficar a ver até ao final...). Fomos comer uns petiscos (eram muitos e com um aspecto de "so typical"). Esses gajos fartam-se de fazer massa á conta da orelheira ensaboada em gordura. Mesmo bom (glup!) Cheguei a casa com o papo cheio e fui dormir. Acordei duas horas depois e dirigi-me a uma estação de serviço para comprar água das pedras. Depois lembrei-me que tinha lutado a minha vida inteira (bem, só prai depois dos 20 anos) para ser socióloga. Sozinhei: Isto não é vida para mim! Uma estação de serviço? Agua das pedras? Decidi então ir a um bar muito e bués de cultural onde costumavam parar sociólogos e afins (sociólogos, estudantes de sociologia e os seus respectivos professores preferidos e outros do mesmo grupo das ciências sociais, mas mais o género de verdadeiros artistas) e mais uns gajos que gostam de música e bebem uns copos e que são olhados pelo resto do gang como "ya, estes até davam uns bons entrevistados para eu fazer um doutoramento sobre culturas juvenis" (agora já são todos amigos porque os primeiros perceberam que "ya, eles é que curtem!"). Fui para casa e dormi até as 11 da matina. Moral da História: sou feliz porque pelo menos não ando nos centros comerciais a impingir cartões de crédito e a perguntar aos outros se gostariam de ser felizes. Olha, tinha que te dar esta seca! Fiquei roida de inveja porque nas minhas fugas à cidade só encontro cidades (ou às tantas vivo numa aldeia e não percebi - por favor não comentem algo com a expressão aldeia global que eu juro que grito). Bjs, linda! Até breve. Foi só para balear saudades.»
Anónima subaltarna


afinal, ainda existem “dinossauros”...

«Em nome dos homens – este ser tão maltratado ultimamente pelo género feminino quando o assunto é romantismo... - permita-me protestar vivamente quanto à subtil alegação de que “já não se fazem homens como antigamente!” Rs...
Olha, engano seu. Os homens (ainda!) continuam a apaixonar-se perdidamente, a sentir o coração kutrum kutrum que nem panela de pápa ta rompê férva quando pressente o tal olhar, o tal sorriso, o tal perfume, ainda – sim senhora! - escreve-se poemas de amor entre duas notas de um violão ou entre dois copos de cerveja, o olhar vago perdido sabe-se lá onde...
Provocação: será que foram as mulheres que deixaram de valorizar essas pequenas coisas? Em nome da emancipação feminina, talvez?
(Xiii, prepara-te meu velho, que lá vem chumbo...rs.)
Excelente poema, é um dos meus preferidos. Já agora, há cerca de 18 anos ofereci este mesmo poema a uma mocinha, colega de infância, por quem estava “adolescentemente apaixonado”. Pena que ela nunca me tenha respondido que sim, nem quando dancei com ela um coladera de quel bom...Thanks pela lembrança!»
Paulino

«Assino por baixo o protesto do Paulino. Sabes que há um rapaz que um dia falava com uma menina amiga no msn e decidiu perguntá-la como dizer na língua materna dela algo como isto “Quero gritar aos quatro ventos que estou perdidamente apaixonado por...” e “... a Rosa que veio do Norte”. Ela disse tudo. O que ela não esperava era que o rapaz ia mandar imprimir tais palavras numa t-shit branca e ficar à espera dela na estação dos comboios em Coimbra, num frio crepúsculo de Outubro. Quando ela chegou, por entre as amigas, ela viu o tal rapaz e elas também. Perceberam que algo de anormal estava a passar, pois ela ficou pedrada a olhar para ele; uns segundos volvidos agarrou-se ao rapaz e em soluços, dizia umas palavras que o rapaz reserva só para ele. Eram apenas amigos, mas o rapaz persistia numa relação amorosa. Tal viria dois meses depois.
Já não se fazem homens como antigamente? Será que as mulheres hodiernas estão prontas para ler os gestos genuinamente românticos? Não os encararão como uns tontos. Pois, não temendo ser tonto no amor, faço tontices de amor apenas para aquelas que as sabem ler.
Paulino, e nunca teremos medo de sermos dinossauros ou ETs.»
Jairzinho


intuição feminística

«Cara candidata à entrada na Sala dos Caramelos (Capelos, desculpem-me! Engano-me sempre...),
Permita-me que eu esclareça consigo - defensora incansável dos direitos das mulheres e portanto dos meus (o que eu acho óptimo, diga-se de passagem) - uma dúvida que me assaltou sobre a questão do silenciamento. Trata-se, com efeito, de uma pergunta importante para um trabalho de “descaramento” (sem autorização do nome do autor, 2006) que eu tento com todas as minhas forças arrancar: terá havido, no referido contexto, antes de se começar a ouvir a deliciosa voz/escrita da Ana Paula, mais surdos ou mais mudas? Se não for pedir muito, gostaria que me enviasse a sua resposta no prazo máximo de 1 ano, em espaço 1.5, letra 12, ocupando 600 páginas, com as referências bibliográficas em texto, diversificadas e destacando o contributo dos teóricos mais revoltados com a hegemonia anglo-saxónica. Claro que serei capaz de reconhecer o seu generoso contributo e agradecer (em nota de rodapé, letra 8) os seus preciosos comentários que ocupariam, volto a repetir para que não persistam dúvidas, 600 páginas em formato A4. Gostaria igualmente de me comprometer, na presença de toda a comunidade virtual, gestual e testemunhal, em partilhar consigo uma fantástica bolsa de estudos durante um ano. Lembro ainda que por este andar poderíamos ir as duas para Cabo Verde - tu para trabalho de campo e eu para um merecido trabalho de praia (pois apesar da dicotomia considero as duas tarefas interdisciplinares). Se eu fosse mais ajuizada, escusava de me sujeitar a semelhante humilhação pública de tentativa de “suborne” (chuuu!!! palavra proibida! não se diz, que é feio!) e aproveitava a treta para escrever. Mas como não sou.... Beijos. A estas horas só me dá para dizer tontearias. (da anónima subalterna que fala mais do que o que deve e que tu desmascaras sempre) hasta breve comandanta Eury. ah, não vou poder estar no dia 12, mas quase sempre estou em qualquer lado, quando precisares. Dá notícias.»
Anónima subalterna

«Cara subalterna
Foi com agrado que acabei de registar a sua pequena solicitação. Vou criar as devidas condições para poder ter uma resposta à sua questão “no prazo máximo de 1 ano, em espaço 1.5, letra 12, ocupando 600 páginas, com as referências bibliográficas em texto, diversificadas e destacando o contributo dos teóricos mais revoltados com a hegemonia anglo-saxónica”. Agradeço o seu nobre gesto em partilhar a sua bolsa. Mas apraz-me informar-lhe que o concessionário Automóveis do Mondego acabou de apresentar o Peugeot 308. Trata-se de um novo modelo que tanto me encorajaria durante o “trabalho de campo”, imprescindível para a resolução da sua questão. Sem a pretensão de possibilitar a sua inclusão (como elemento principal do grupo-alvo) no Observatório do Endividamento dos Consumidores, preferia estabelecer uma relação de proximidade com o Peugeot 308, na medida em que este modelo carece de um estudo sociológico a partir do sul. Risosss. Um abraço»
Eury

«Minhas senhoras: muita me apraz vir ter a este blog e encontrar por estas linhas escrita tão elaborada como prenha de humor e é do meu órgão pulsante que vos agradeço em verdade a generosidade com que apresentais este líquido para amolecer lentes de contacto ressequidas do trabalho diário. O poema da Ana Paula, que eu não conhecia, está também muito bem e é por estas e também por outras que apresento os meus sinceros parabéns à dona deste espaço e me dou por contente por tê-lo entre os meus preciosos e exclusivos links.»
Eileen

«Cara Eileen
Igualmente, me apraz ter o seu blog entre os poucos que visito diariamente. Realmente, a sua escrita é "uma delícia para quem tem o bichinho da leitura". Confesso que me agrada bastante quando a Eileen “manda à merda”.
Saudações de Coimbra»
Eury


Un djatu...

«(...) continuar a negligenciar o papel do crioulo significa continuar a ignorar o caboverdiano que pensa, age e se expressa a partir do crioulo, mesmo que ele domine o Japonês.»
Obikuelu


...e a tod@s, obrigada pela vossa visita!
Eury

saudades do antigamente


Na Minha Terra Também Se Ama

É hoje, pelas 18:30mn, o lançamento do
livro póstumo de Dionísia Velhinho Rodrigues, D. Bia d’Velhinho Rodrigues, intitulado Na Minha Terra Também Se Ama. Esta primeira mulher das letras da minha aldeia à beira mar morreu no passado mês de Abril, aos 85 anos, deixando o seu primeiro livro no prelo. A apresentação estará a cargo da Lígia Fonseca.


no antigamente

Falaram-me de um passado cheio de estórias vividas na minha aldeia à beira mar. Durante a minha infância, ouvia incansavelmente as estórias de boka‑portu. A noite trazia essas estórias, como se de um passo de magia se tratasse.

Às segundas-feiras, depois do ressonante “seti hora na tudu kantu di Kaoberdi”, aquele famoso noticiário na Rádio Nacional, o humorista nhu Puxim (Anastácio Lopes) desabrochava as gargalhadas lá na casa caíada de branco, onde acompanhávamos assiduamente aquele programa radiofónico. “Fidju di boka‑portu” – dizia o papai Yoto.

Ainda guardo comigo um mapa com o nome de vários membros da família boka‑portuense. Neste meu mapa porta-porta, tentei resgatar, juntamente com as personagens, alguns factos ocorridos à volta da baía do Porto. Infelizmente, hoje, ao dar uma olhadela no Mapa de Boka-Portu, apercebi-me de que as grandes referências da minha baía estão a caminhar para o mundo dos mortos. Apenas para recordar, deixo aqui alguns nomes estóricos: nha Quitéria, nha Beta, nha Liminha, Sr. Olímpio, Sr. Vicente Luciano, Sr. Velhinho Rodrigues, D. Bia, Tuy, nha Amélia, Papa di Djodja, Tio Pedro, titio Beraldo, nhu Tánazio, bisavô Manel di Santu, nha Razência, nhu Donda, Maria Miranda, Dota, Ponpilo, vó Nené d’Raul (a Elisa dos olhos cor‑de‑mel), papai Yoto, mamãi Dinora... E, há poucos meses, desapareceu a última velharia masculina do Porto, o vô Raul d’Missão.

Arrisco-me a dizer que Gil d’Jóia e o Cabiote são as figuras lendárias da minha aldeia que ainda se encontram no mundo vivente... Como dizem as estatísticas, as mulheres são mais resistentes. Por isso, ainda a pouco tempo atrás, a mais velha da aldeia era a Margarida Kraki, que caminhou para a eternidade com mais de noventa anos. Se não me engano, quase arrebentou a meta dos 100 anitos. Não tenho notícias da Nhánhá, segunda esposa do bisavô Manel di Santu. Ela deve ser a mais velha lá da aldeia. Dizem que a velhota ainda vai viver muitos mais anos. Se os factos não me falham, posso acrescentar que a pessoa que morreu com mais anos de idade na Calheta foi o Biaricá, que morreu aos 110 anos. Era o meu bisavô. Quando morreu, eu tinha nove anos. E lembro-me da mamãi Dinora a gabar-se que o velhote morreu um dia antes de completar os seus 111º primaveras. Este meu bisavô comeu muita katchupa, e não recusava um bom singuelu (desculpem o anacronismo!)...


Calheta, ma petite ville

Sempre que lá regresso, fico triste por encontrar a minha Calheta cada vez mais pobre: as grandes referências estão a caminhar para o mundo dos mortos (deixando a malta jovem desolada, sem as palavras de repressão pela rebeldia juvenil ou de incentivo pelos actos “gloriosos”).

A aldeia encheu-se de prédios coloridos e modernos, as casas dos avós estão a cair em pedaços, a noite ficou relativamente mais clara, a praça do Porto deixou de ser um espaço de estórias, a areia preta do Porto está a perder o seu brilho, os meninos da minha rua já não jogam à apanhada, as meninas já não vão às tranças na casa d’Angelina, os telemóveis abundam nas ruas, a Internet quase se transforma na praça de reencontros.

Quando cresci, a baía do Porto já estava quase vazia de personalidades do antigamente, daquele tempo que parece tão longínquo na minha memória de menina‑moça. O papai Yoto contava-me de quando os homens desciam à antiga praça velha. Quando penso na praça velha que ficava sentada no Porto de Calheta sinto um aperto enorme no meu coração. Ao lado da praça havia um Pelourinho, onde vendia-se açukrinha e um pouco da doçaria lá da aldeia. Na década de noventa, quando estudava na cidade grande, num maldito dia, recebi a triste notícia de que a praça velha ia ser demolida e que uma outra seria construída para levar a modernidade ao meu Porto. Na altura, sentia uma dor terrível mais porque tinham deitado abaixo duas velhas tamareiras que davam tâmaras tão boas aos olhos da criançada, que não deixava de atirar umas pedradas enquanto esperava pela sua vez para encher as suas vasilhas de água no velho xafariz, também agora modernizado. O meu Porto, o Porto que vinha nas estórias do papai Yoto, desapareceu e ficaram apenas as estórias e a imagem que vejo num postal da Deutsch Wagram, Áustria. Que modernidade é está que esta a apagar o meu passado, o passado de boka-portu?...

«o verão trouxe-me»

Os sintomas do verão já atingiram a Ala Marginal e no conhecido Café Margoso não se fala de outra coisa. No meu caso, aqui nesta cidade distante a transpirar os 37º, entre os meus afazeres inadiáveis e os meus planos para uns dias de férias lá no norte, o verão trouxe-me uma tonelada de recordações infanto-juvenis, da aldeia onde nasci e onde está o embrião da minha família, apesar das tentativas do vento em espalhar pequenos retalhos pelos quatro cantos do mundo.

O verão trouxe-me a vontade de arrumar a minha velha mochila de couro e seguir viagem para Calheta. O verão trouxe-me uma fina saudade da baía do porto; do reencontro prolongado com a minha família boka-portuense, depois de um ano lectivo fora de casa; da minha varanda na casa caiada de branco, escutando o som das ondas lá no fundo; do sabor do silêncio da noite nos meus lábios; da ida às tranças na casa d’Angelina; dos jogos na minha rua; das minhas fantasias de sereia pura, filha do mar.

O verão trouxe-me a recordação das previsões do Cabiote (pescador da aldeia) acerca da chuva; da secura da minha aldeia; do pouco cheiro de terra molhada; do curto sorriso da mamãi Dinora; do amarelo das mangas madurinhas de Txan pa Riba; das conversas com o papai Yoto que me apontava para o pouco verde no Monte Galion, após as primeiras minguadas chuvas; do milho assado no forno fincado na cozinha de pedra; dos meus soluços até adormecer por não me terem deixado dar uma escapadela até à praça do Porto (injustiça, pá! o meu mano ia todos os dias, sem falta... no meu caso, nem valia a pena protestar!).

O verão trouxe-me as saudades, muitas saudades...

Imagem: João Lima

Parabéns, Mandela!

É sempre emocionante ver as imagens e ouvir as palavras acerca de uma luta que ainda é necessária. No espectáculo multicultural de celebração dos seus noventa anitos, o ex-prisioneiro 46664 falou da liberdade e da paz, relembrando que está nas nossas mãos a possibilidade de um mundo melhor. É no dia 18 de Julho os anos do menino Nelson Mandela, mas a festa já começou: Fundação Nelson Mandela.

vozes de diferentes gerações
















Destino de Bai
Antologia de Poesia Inédita Cabo-Verdiana

José Luís Hopffer Almada
Carlos Araújo
Eileen Barbosa
Kaká Barboza
Paulino Dias
G. T. Didial
Vera Duarte
Filinto Elísio
Anita Faria
Tchalê Figueira
Jorge Carlos Fonseca
Margarida Fontes
Corsino Fortes
Adriano Gominho
Lay Lobo
José Vicente Lopes
Chissana Magalhães
Vasco Martins
Mito
Jorge Miranda
António de Nevada
Oswaldo Osório
Valdemar Pereira
Maria Helena Sato
Luiz Silva
Mário Lúcio Sousa
Danny Spínola
Paula Vasconcelos
Arménio Vieira
Artur Vieira
José Maria Neves

Desenhos: Elisa Schneble


Hoje, em Coimbra, foi apresentada esta antologia, que junta vozes de diferentes gerações cabo-verdianas. Durante a sessão de apresentação, particularmente duas vozes foram ressaltadas: Eileen Almeida Barbosa “Sou uma caboverdesa”; Paulino Dias “Versos soltos”. Morri de tanto orgulho desta nova geração! E não parava de largar sorrisos. Parabéns aos poetas e às poetizas que participaram nesta antologia!...

33º Aniversário da Independência de Cabo Verde


No país e na diáspora, várias actividades marcam este grande dia na vida do povo cabo-verdiano. Este ano, mais uma vez, a cidade de Coimbra não deixa esta data passar em branco. Desde o dia 21 de Junho, um conjunto de actividades culturais e debates têm sido levados a cabo pela Associação de Estudantes Cabo-verdian@s em Coimbra e pela Saúde em Português. Procurando chamar à atenção para a situação das mulheres nas ilhas, no dia 30 de Junho, foi realizado uma mesa redonda sobre o significado da independência para as mulheres cabo‑verdianas, destacando a discriminação feminina em diferentes áreas (enfatizando a medida de suspensão temporária das alunas grávidas nos estabelecimentos de ensino secundário).


Mesa Redonda: Mulher Cabo-verdiana Contemporânea

Roselma Évora
Raúl Fernandes
Clara Spencer
Odair Varela
Katia Cardoso
Carlos Elias Barbosa
Eurídice Monteiro



Ainda no âmbito da comemoração da independência nacional, no dia 7 de Julho, está previsto a participação do Primeiro Ministro José Maria Neves nas festividades nesta cidade universitária.

Women's Worlds 2008

conta com mais de 3000 propostas de comunicação e com a presença de prestigiad@s académic@s e activistas.

Ingrid Betancourt


o sabor da liberdade

 
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